sábado, 27 de dezembro de 2008

José Fabrício das Neves (30)

Juca Perão e uma neta (Coronel Vivida-PR)

José Felisberto, combatente (2)

Na postagem anterior falávamos de nossa chegada na residência de José da Silva Perão, o Juca Perão, residente em Coronel Vivida-PR, e da calorosa recepção que eu, o repórter-fotográfico Marco Cezar e o músico Vicente Telles tivemos. Juca Perão é filho do falecido José Alves Perão (José Felisberto), companheiro do monge José Maria de Castro Agostinho e de José Fabrício das Neves no combate do Irani. Juca, tio de Vicente Telles, nos recebeu falando e sorrindo. Os principais trechos da entrevista realizada no dia 22 de julho de 2007 estão abaixo.

Juca – [...] eu tava brincando fora assim, de repente ouvi aquele barulho, eu olhava... quando vi aquele homem corri. Corri e daí ele riu, meu pai riu né, quando ele riu eu reconheci... E ele falou:

- Ta correndo de homem, relaxado!

Mas ai eu vi que era ele. Diz que tinha terminado a tal revolução, diz que tinha terminado, ele veio pra casa. E com certeza decerto tinha mesmo, eu não me lembro mesmo, com certeza tinha terminado porque daí ele ficou em casa, de repente vieram pro Paraná.

No dia que ele chegou decerto tinha terminado a tal revolução, porque ele veio com todo o armamento e depois eu não vi, eu era gurização, depois não vi mais, não vi [...], não vi briga, só vi ali onde é o cemitério do Contestado [Irani-SC], onde foi a última briga, que morreu sete, num combate. E ai fecharam de vara, a polícia, eu ia varando a cavalo eu vi assim, eu já sabia, tinha medo, piá tem medo dessas coisas né, eu tinha medo, fazia volta e ali onde é o cemitério hoje, é o que o Vicente conta e os outros contam. E depois, daí, quando foi ali... não lembro bem, no ano quarenta, ele ficou, ele ficou pelo sertão do Irani o veio meu pai, meio escondido, não sei quanto tempo, né.

E daí no ano 40 foi que ele resolveu vir embora, pro Paraná, porque a perseguição ainda tava meia boa [...] No ano 37 por ali foi a época que ficou uma temporada no mato, uma temporada grande mesmo... Daí, então, quando foi no ano 40 [....] tinha terminado decerto aquela bronca, ele parou uns tempos em casa, ele parou acho que um ano, mais ou menos...

Telles – Se cuidando...

Juca - No Sertão de Irani, lá embaixo, lá não sei onde é hoje...

Telles - Itá, parece.

Juca - De repente um dia ele apareceu e falou: olha temo que ir pro Paraná porque a turma anda atrás de mim de novo...

Telles - a operação limpeza...

Juca - ...é! E quando aí arrumemo a mochila até sair lá onde mora o Vicente já chegou mais uma escolta, lááá onde o velho morava, queriam [...]. E ainda tinha mais uma aqui que contavam, essa eu não vi, mas contavam que ficou com certeza ficou muita viúva e as tal viúva que tinham dinheiro, por exemplo, diz que davam pela cabeça do velho Perão, que levasse lá naquela época, iam [...]. E demais outros companheiros dele, do Fabrício, de mais esse e mais aquele.

Telles - ... do José Fabrício das Neves.

Juca – E daí foi o seguinte, daí que o velho Perão disse: “Vou levar a minha cabeça para o Paraná”. [risos] E veio no ano 40, nos era tudo gurizada [...]. Aquela viagem... hoje eu tô meio esquecido...

Foi em 1940.

Juca – Foi!

O senhor tinha quantos anos?

Juca – Eu tinha mais ou menos uns 13 para 14 anos [...] era gurização. E daí era o seguinte: era muita gente que acompanhou. Da família Perão tinha 22 pessoas, e acompanhou muitos coitado, muitos acompanhou, o velho trouxe. Eu puxava num cargueiro de piazadinha, não dava pra vim tudo a pé... A pé do Irani até aqui no falado Jacutinga... A pé uma grande parte, e outros [...] piazadinha de quatro cinco anos pra baixo arrumaram um cargueiro, aí ponhava dois dum lado, dois doutro, e tal! E daí eu piazão mais ou menos era o que puxava o cargueiro de criança. Quando chegou no Chapecó Grande, ali a porca torceu o rabo, como diz um causo. Por que... ninguém tinha dinheiro, pois era tudo corrido, e pra pagar a balsa pra todo aquele povo... não podia, não tinha jeito. Tinha um despraiado, um despraiadão, então o que dava pra varar por água varava... e eu com meu cargueirinho varei, né! Minha mãe... o velho Perão ainda varou, a pé, mas a minha mãe era mais velha não, tiveram que segurar.

Telles – Aquelas viagens que se fazia, passava pelo despraiado.

Juca – Esse passo era depois que passava no Irani no Chapecó Grande, mas ele era uma... Eu acho que dava uns 500 metros de largura, e varar aquilo a pé... E existia uma carroça, uma carroça com o genro [Alípio Cordeiro] do velho Perão. E viu, naquele tempo só existia carroça com eixo de madeira, por exemplo, né, e no vará, que era muita pedra, pedra alta, pedra da altura desta cadeira, e tinha que varar, porque não tinha outro lugar, uma bacia muito ruim, no tal Chapecó. Ai de repente, no meio do rio, não é que quebra o eixo da carroça? E daí? E aquele povo? Tinha que baldear aquele povo pro outro lado do Chapecó, e os que já tavam pra lá, mas era cedo, era 10 horas, começaram a fazer pouso! Foram fazer pouso lá, e tal, arrumar fogo e tal. Porque os pouso era sempre embaixo de árvore. Era difícil um fazendeiro dar um galpão, pra pousar como se diz uma comitiva daquela, que era uma comitiva grande, né. Lá um que outro dava, decerto eles conhecia, via que era povo que estava escapando, né, então dava pouso, às vezes até janta dava. A maioria era embaixo das árvores... Já tinha um irmão meu mais véio, que é filho do véio Perão, né, era o mais véio da turma, tinha um cavalo bom e tal [Miguel], então [...]

Então [...] numa altura pra cá, depois que ele... Tudo quando era pro almoço todo mundo era no acampamento, todo mundo almoçava então ele logo ele tocava na frente já pra arrumar um lugar praquele povo pousar. Meu irmão mais velho. E ele ia e depois contava: hoje eu arrumei um galpão. Então tudo bem! Ele arrumou um galpão.

Como vocês chegaram até aqui? Tinham terras? Tinham indicação de alguém?

Juca – Tinha indicação. Esse homem que era o dono da carroça, ele veio quando começou a revolução, era um homem inteligente, e tinha um recursinho, o Alípio Cordeiro... Ele então encilhou uma mula [...] lá e veio pro Paraná e achou aqui ó, aqui ó, até lhe mostro daqui... ele comprou terra... naquele morro lá... ele tinha recurso e naquele tempo não valia nada a terra aqui. Ele comprou bastante terra e aí foi lá e trouxe tudo, trouxe cunhado, trouxe sogro, trouxe todo mundo e colocou todo mundo aí. E existe agora de resto eu aqui e um irmão em Dois Vizinhos, o Nízio, e outro aqui, como é que... péra aí uma grande cidade de Santa Catarina, capital, Florianópolis, tem um mais novo do que eu, o Felisberto...

[...]

Ele e o José Bento, que era genro dele, dicerto iam morrer, porque os que foram lá morreram tudo no combate, né! Que foi uma emboscada né! E quando eles foram pegar os cavalos para encilhar pra sair, o cavalo do meu pai e desse genro dele tinham escapado e eles não puderam achar. Quando tavam campiando longe derrepente viram porrr-porrr-porrr tiralhada, né. Ai voltaram tinha sete morto. Então diz ele escapou porque o cavalo dele escapou...

Telles – No combate de Irani.

Juca – No combate de Irani!

Então ele não participou...

Telles - ...não, direto não!

Atuou na organização...

Juca - ...é, na organização.

E o que ele contava sobre o motivo desse combate?

Juca – Ah! Ele contava que era que nem ta sendo aqui, por causa de terra, de terra. O Governo queria tomar a terra dos colonhos, e ele se ponhou do lado dos colonho, né, e güentou o galho até que deu. Quando não deu mais, aí fez ele vir pro Paraná. Mas ele contava que era por causa disso. E eu lembro tão bem que lá no sertão do Irani tinha muito terreno lá, daí nos se escondemo lá, ele escondeu nós uma temporada lá. Mas ele não pousava em nenhum acampamento. Ele chegava à noite ele pegava uns [...] de fogo e ia pousar no pé de uma árvore. Porque se tinha acampamento a turma acho, né. E era por causa disso que eu ouvia falar na época. (Continua)

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