As pesquisas que conduziram ao livro “O mato do tigre e o campo do gato – José Fabrício das Neves e o combate do Irani”, não indicaram a presença do personagem no restante do Contestado. Encontrei referência (residual, digamos), à presença de José Fabrício com José Maria no Taquaruçu, antes do início dos confrontos. Lá por agosto de 1912. Indiquei no livro informações de Antônio Martins Fabrício das Neves na entrevista ao Arquivo Histórico de Concórdia, a respeito das ligações de José Fabrício e José Maria, com Praxedes Gomes Damasceno.
Contatos anteriores ao combate do Irani. O senhor Antônio dizia que Praxedes estava em Taquaruçu “botado lá” pelo Fabrício. Procurei verificar essa informação e descobri que Praxedes estava na área desde o final do século 19. E fiquei por ali. A informação não batia. Mas como esses velhos não mentem, e confirmei várias outras informações do senhor Antônio, todas bem precisas, é necessário aguardar que novas fontes forneçam os elementos que ajudem a fechar o quadro.
O cerco
O livro já estava circulando e eu prosseguindo com as pesquisas, quando me deparei com duas referências do general Setembrino de Carvalho, a respeito de José Fabrício, durante o cerco a Santa Maria, em 1915, fase final do movimento.
Apenas para nos situarmos, o conflito teve, a grosso modo, a seguinte seqüência: depois do combate do Irani (1912), o movimento recomeça no final de 1913, no reduto de Taquaruçu (hoje Fraiburgo), depois o reduto de Caraguatá e, por fim, o maior de todos, com cerca de cinco mil edificações, o de Santa Maria (1915).
Esses eram os redutos principais, mas existiram dezenas, menores. Entre 1913 e 1915, até o cerco de Santa Maria, executado meticulosamente por Setembrino de Carvalho, os rebeldes conquistaram uma ampla área no vale do rio do Peixe, mobilizando cerca de 20 mil pessoas.
“Notícias apavorantes”
O cerco a Santa Maria implicou o corte no fornecimento de gêneros, levando fome e o surgimento de doenças, e a conquista dos redutos satélites. Em seu “Relatório”, o general Setembrino informa que na véspera do ataque final a Santa Maria, surgiram “notícias apavorantes sobre nova revolta nas bandas do Irani”. (General Setembrino de Carvalho. Relatório. Campanha do Contestado. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial. s/d, p. 120)
Por causa disso, em março de 1915, expõe ao Ministro da Guerra: “Espero reduzir os bandoleiros do Santa Maria antes que aperte o frio. Mas como não há certeza da terminação da luta com a sua queda definitiva, porque se anuncia outro levante nas bandas do Irani, desejo aparelhar a tropa de recursos que a garantam contra os rigores do inverno”. (idem Relatório, p. 124)
Dessa vez foi a Fundação Getúlio Vargas (CPDOC), que forneceu as evidências complementares: telegramas trocados entre o então Chefe de Polícia do Paraná, Vieira Albuquerque, e Setembrino de Carvalho, relacionados aos fatos no Irani. Nunca é demais lembrar que só depois de 1916, um ano depois, é que o Estado de Santa Catarina passa a administrar toda a região a oeste do rio do Peixe, onde estão os campos de Palmas/Irani.
Tudo começou com um telegrama do Chefe de Polícia ao general Setembrino, com base em informações transmitidas pelo subdelegado do rio do Peixe, Gonçalino Silva. “Infelizmente foram baldados todos esforços sentido manter sertão pacificado. José Fabrício está aliciando elementos dispondo seiscentos tantas Winchester. Ainda não fez hostilidades estando concentrados barra Jacutinga”. (Telegrama nº 569, de 4.3.1915, do Chefe de Polícia do Paraná, Vieira Cavalcanti, ao general Setembrino de Carvalho. CPDOC-FGV/FSC 15.03.04/5 – T. 7 antigo A 43).
“Levante próximo”
O Chefe de Polícia determinou então que o subdelegado Gonçalino reunisse forças e efetuasse a prisão de José Fabrício. O policial respondeu imediatamente por telegrama: “Cientifico não dispor elementos efetuar-se prisão José Fabrício. Individuo conta superior recursos meu contingente”. E que aguardava ordens do Chefe de Polícia. (Telegrama nº 10, de 5.3.1915, do subdelegado Gonçalino Silva ao general Setembrino de Carvalho. CPDOC-FGV/FSC 15.03.04/2 – T. 7 antigo A 43).
São com esses (e outros) elementos que trabalho no momento. Os arquivos do Exército (Rio) e do Paraná (Palmas, Curitiba) devem conter outras referências. Seu objetivo era romper o cerco de Santa Maria, com a passagem dos combatentes para os campos de Palmas/Irani, no outro lado do vale do rio do Peixe.
José Fabrício não foi batido nessa ocasião, como nos confirma a Mensagem Anual do governador Hercílio Luz encaminhado ao legislativo. Diz que ao assumir em 28 de setembro de 1918, “a situação no município de Cruzeiro era causa das maiores e justificadas apreensões”. Boatos, segundo ele, “os mais desencontrados e aterradores pareciam indicar um levante próximo de elementos perniciosos a frente dos quais se encontraria José Fabrício das Neves”. (Mensagem Anual. 1919. Governador Hercílio Luz). Tudo isso torna mais evidente a importância do aprofundamento das pesquisas, a diversificação das fontes e a releitura do que se escreveu sobre o tema Contestado.
José Fabrício das Neves (segurando o cavalo), ao lado de um Miguel (não identificado). Acervo: Reinaldo Antunes (Pinhão-PR)
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