O papel de Miguel Soares Fragoso (1ª parte)
Miguel Fragoso foi apontado pela historiografia paranaense como o comandante dos caboclos no combate de 22 de outubro de 1912 em Irani. “A figura sombria de Miguel Fragoso, indigitado cabecilho da malta assassina”, escreve Fredericindo Marés de Souza, “evidenciava-se torva dentro de uma negra legenda do crime”, pois “duvidava-se da capacidade guerreira do místico José Maria”. O jornal A República, conforme o mesmo autor, apontava José Maria como um homem bom, mas que estaria servindo “apenas de gato morto a Fragoso e seus sequazes”, segundo Souza (1987, p. 125).
Pouco antes da meia-noite de 23 de outubro de 1912, o chefe de polícia do Paraná escreveu de Palmas ao governador Carlos Cavalcanti, do Paraná, relatando o temor existente na cidade quanto a uma possível invasão dos caboclos. Fala em 500 homens “armados e municiados”, dirigidos pelo “indivíduo Miguel Fragoso” (SOUZA, 1987, p. 125-126). No dia seguinte, 24, são enviados reforços para a região de Palmas, enquanto o governador paranaense se dirige ao presidente Hermes da Fonseca pedindo a intervenção do Exército. Isso resultou na organização de uma expedição sob o comando do coronel Antônio Sebastião Basílio Pyrrho, comandante do 5º Regimento de Infantaria aquartelado em Ponta Grossa-PR (SOUZA, 1987, p. 128-129).
As forças estaduais em Palmas foram incorporadas à coluna do coronel Pyrrho, composta por regimentos de infantaria e cavalaria, uma companhia de metralhadoras e “duas bocas de fogo de artilharia montada”, segundo Rosa Filho (1988). Acrescenta que de Florianópolis seguiu uma coluna constituída pelo 54ª Batalhão de Caçadores e a Força Pública (Polícia Militar) do Estado. O coronel (Guarda Nacional) Manuel Fabrício Vieira, por outro lado, que havia se oferecido para enfrentar os homens de José Maria no Irani e recebera um não precisa, se incorporou à expedição, assim como outros grandes fazendeiros e caudilhos de Santa Catarina e do Paraná (SOUZA, 1987, p. 129).
A primeira providência de Pyrrho, foi enviar oficiais e praças a paisana para buscar informações nas regiões do Irani e Jacutinga, sob o comando do capitão Antônio Ribeiro dos Santos, “guiados por vaqueanos”. Esses homens andaram 10 dias pela área, percorrendo cerca de 400 quilômetros (60 léguas) e constataram que “em certos quarteirões, os sitiantes haviam fugido”, informa Souza. “O facínora José Fabrício, vulgo Juca Fabrício, sumira. Quatro membros da família Germano e o preto Sebastião”, este acusado de ter se apossado da arma de um policial no combate, “não foram encontrados no lugar” (Catanduvas). “Da família Fabrício só se achava em casa Miguel, por estar doente” (SOUZA, 1987, p. 130).
Esses militares relataram que “no Faxinal dos Fabrícios, povoado de 13 casas”, havia uma “decente capela, onde se notava, no altar, entre outros santos, o retrato de João Maria”. O restante de Irani “é todo de sítios isolados, em geral, cômodos, providos do necessário, próximo das roças. Aparentava zona próspera”, cita o autor. No local onde ocorrera o combate e “na casa de Bentinho”, os mesmos militares encontraram 20 gorros, cantis, bandoleiras, quatro capotes da polícia e um chapéu “com fita branca que pertenceu ao monge”, segundo “A república” de 19 de dezembro de 1912 (SOUZA, 1987, p. 130-131).
De acordo com Rosa Filho (1998), tropas da cavalaria do Exército percorreram todas as estradas de acesso a Irani e o “local do encontro anterior foi minuciosamente batido e explorado nos seus arreadores. Nada foi encontrado. Informações dos poucos moradores, ainda apavorados, resultaram no retrocesso da coluna”. Dessa forma, “depois de peregrinar quase um mês pelos arredores palmeirenses, a esperançosa Coluna Pyrrho era dissolvida, sem ter um só encontro com os rebeldes sertanejos”.
Os resultados foram decepcionantes para os dois autores paranaenses, enquanto o Ministério da Guerra se justificava, “dizendo que era impossível o Exército organizar um plano de combate e, vista de ser desconhecida a topografia do terreno”. Isso significava a ausência de mapas precisos, tornando o local “quase inatacável”, já que a “formação acidentada do terreno assegurava aos fanáticos magníficas posições”. A tudo isso se somou a falta de vias de transporte adequadas, tornando a perseguição uma “verdadeira inércia”. Uma vez “desbaratados, mas vencedores no primeiro encontro, os fanáticos sobreviventes retrocederam para a margem esquerda do rio do Peixe”, indo se refugiar na região de Campos Novos (ROSA FILHO, 1998).
Enquanto as buscas aconteciam, foi aberto um inquérito policial em Palmas, visando apurar os detalhes do combate de Irani, visando satisfazer a opinião pública que “exigia a punição dos culpados”. Ao mesmo tempo, um conselho de guerra investigou a participação dos oficiais sobreviventes do combate. “Do lado dos bandoleiros”, destaca Souza (1987, p. 131-132), “apontava-se como o maior responsável, como se observa nos primeiros comunicados, Miguel Fragoso”, um “posseiro na zona do Irani chamada Sertãozinho, no lugar Engenho Velho”, nas margens do rio Uruguai, hoje município de Concórdia. “Teria sido ele o comandante de briga, uma espécie de general fanático, na polvorosa espera do Banhado Grande”.
Nascido em Rio Negro (PR) por volta de 1856, Miguel Soares Fragoso era filho de Honório Soares Fragoso e Maria do Pilar, tendo se casado em 17 de maio de 1874 com Maria Vieira Machado, filha de Manoel Vieira Machado e Anna do Rosário [informações enviadas por um descendente dos Fragoso, Henrique Fendrich]. Estava com cerca de 38 anos de idade quando participou da Revolução Federalista (1893-1895), tendo ingressado nas tropas de Gumercindo Saraiva. Sua presença nas frentes de combate foi registrada pelo médico Ângelo Dourado, que acompanhou as forças federalistas (DOURADO, 1977, p. 220-221; 227).
Outras informações sobre ele são do frei Valentin Tambosi, autor da primeira parte do Livro de Crônicas da Capela de Nossa Senhora Aparecida de Engenho Velho (Paróquia N. S. do Rosário, Concórdia). O texto de frei Tambosi foi reproduzido pelo lavrador e funcionário público José Antônio Puntel e entregue ao autor. Nascido em 10 de julho de 1943, em Engenho Velho, Puntel reúne depoimentos de antigos moradores e escritos sobre a história do lugar.
“Engenho Velho é uma localidade situada na confluência do lajeado dos Fragosos com o rio Jacutinga, uns 25 quilômetros de Concórdia, na estrada Concórdia-Itá”, escreve frei Tambosi na década de 1940, com base em antigos relatos de franciscanos. “É um dos lugares mais antigos de Concórdia e está ligado ao nome e a ação do coronel Miguel Soares Fragoso”, assinala. Fragoso teria chegado à região por volta de 1900, permanecendo “18 meses nos campos do Irani”. Pelas contas do frei, por volta de 1903, Miguel já se encontrava no atual distrito de Santo Antônio da Boa Vista (Concórdia), transferindo-se em 1909 para a barra do lajeado Fragoso (Engenho Velho), um lugar conhecido antigamente como barra de Santa Cruz, no mesmo município (TAMBOSI, 1941).
O fotógrafo Júlio Gomes conheceu as estruturas remanescentes de um engenho hidráulico, mandado construir por Miguel Fragoso. Serrava madeira, fabricava aguardente e açúcar. “Tudo isso está hoje lá embaixo, com cerca de 60 metros de água por cima”, diz, mostrando a paisagem do lago de Itá na altura da foz do rio Jacutinga.
“Por toda a região”, prossegue frei Tambosi, “viviam espalhadas várias famílias, que tinham vindo do Rio Negro com o coronel”, citando os nomes de Augusto, Pedro e Miguel Ruth Schmitt, “e uma irmã casada com Ponciano dos Passos”, além de José e Constante Gren, Joaquim Fragoso (irmão de Miguel) e seu sobrinho José Fragoso. “Em sua maioria moravam perto do atual Engenho Velho, onde cuidavam das plantações e da criação do coronel”, diz frei Tambosi. “Era o sistema feudal dos fazendeiros, sendo Fragoso o cabeça, que de tudo cuidava, indo buscar com cargueiros o necessário em Palmas e Porto União”, acrescenta. Em troca, “trabalhavam todos para o coronel” (TAMBOSI, 1941).
Nilson Thomé traça um perfil interessante desse personagem. “Fragoso era amigo dos principais fazendeiros da região, muitos deles ex-maragatos, como o coronel Domingos Soares, líder político em Palmas”, assinala. Também “mantinha boas relações com a numerosa família Fabrício das Neves, posseira e proprietária de grandes extensões no Irani”. Federalista e monarquista “convicto”, após “se revelar pela coragem em combate, entre 1895 e 1912, mostrou-se pacífico e religioso, vindo a pregar a palavra de Deus”, adotando o uso de “plantas medicinais para curar doentes, com o que passou a ser muito estimado pelos habitantes da região”. Por isso, os caboclos o tinham como um “homem de paz de forte liderança e dispunham-se a defendê-lo ante qualquer ameaça, com o uso de armas, se necessário”. Era chamado de coronel Fragoso como “sinal de respeito”(THOMÉ. 1999, p. 122).
Maurício Vinhas de Queiroz o situa “junto ao rio Jacutinga e sobre a fronteira do Rio Grande”, onde havia um “largo trato ocupado por Miguel Fragoso e seu pessoal desde os tempos que se seguiram ao fracasso do Movimento Federalista”. (1981, p. 92) O “antigo chefe maragato” era “capaz de levantar a qualquer momento 100 homens em armas”, afirma Queiroz, que destaca as ligações entre Fragoso e José Maria (QUEIROZ, 1981. p. 93) .
Em relação a sua participação no combate de 22 de outubro de 1912, no Irani, Queiroz diz o seguinte: “Miguel Fragoso ficara seguramente na reserva, com o grosso de seu pessoal, pronto parta intervir em caso de necessidade para socorrer o monge, embora isto nunca tivesse ficado de todo comprovado nos vários inquéritos policiais e militares que se seguiram aos acontecimentos”. E mais: “O que ficou indubitavelmente apurado é que, se bem não tivesse participado pessoalmente da refrega, grande parte de seu pessoal ali atuou, sem que ele o tivesse podido ou querido impedir”. O autor destaca ainda a “sólida proteção” recebida por Miguel Fragoso do coronel de Palmas Domingos Soares e a “benevolência das autoridades federais” (QUEIROZ, 1981, p. 101).
Voltemos ao frei Tambosi, para que Miguel Fragoso era “homem de muita religião”, e “cuidou que viessem os padres em visita a este lugar”. Além disso, mandou construir uma “capelinha, que seria dedicada a Nossa Senhora da Conceição”. Enquanto a edificação era erguida, Fragoso providenciou a vinda de padres de Palmas, passando por Irani, entre eles os freis Solano Schmitt, Luiz e Dimas, que “celebravam a santa missa na própria casa do coronel”, em Engenho Velho.
Pouco antes da conclusão da capela, entretanto, “deu-se o desastre. Faltando os pregos, empilharam a madeira dentro da igreja. Na queima de uma roça vizinha, queimou também a capela”, em 1910. Desde o ano anterior, devido a problemas de saúde com a esposa, Miguel Fragoso havia construído uma casa próximo do engenho. Sobre ele, frei Solano Schmitt escreveu várias crônicas em edições da revista “Vida Franciscana” (TAMBOSI, 1941). Segundo Nilson Thomé (THOMÉ, 1999, p. 125), o monge José Maria teria conhecido Miguel Fragoso por volta de 1910, com quem teria “aprendido, ao menos em parte, lições de religião e homeopatia”.
Miguel Fragoso foi apontado pela historiografia paranaense como o comandante dos caboclos no combate de 22 de outubro de 1912 em Irani. “A figura sombria de Miguel Fragoso, indigitado cabecilho da malta assassina”, escreve Fredericindo Marés de Souza, “evidenciava-se torva dentro de uma negra legenda do crime”, pois “duvidava-se da capacidade guerreira do místico José Maria”. O jornal A República, conforme o mesmo autor, apontava José Maria como um homem bom, mas que estaria servindo “apenas de gato morto a Fragoso e seus sequazes”, segundo Souza (1987, p. 125).
Pouco antes da meia-noite de 23 de outubro de 1912, o chefe de polícia do Paraná escreveu de Palmas ao governador Carlos Cavalcanti, do Paraná, relatando o temor existente na cidade quanto a uma possível invasão dos caboclos. Fala em 500 homens “armados e municiados”, dirigidos pelo “indivíduo Miguel Fragoso” (SOUZA, 1987, p. 125-126). No dia seguinte, 24, são enviados reforços para a região de Palmas, enquanto o governador paranaense se dirige ao presidente Hermes da Fonseca pedindo a intervenção do Exército. Isso resultou na organização de uma expedição sob o comando do coronel Antônio Sebastião Basílio Pyrrho, comandante do 5º Regimento de Infantaria aquartelado em Ponta Grossa-PR (SOUZA, 1987, p. 128-129).
As forças estaduais em Palmas foram incorporadas à coluna do coronel Pyrrho, composta por regimentos de infantaria e cavalaria, uma companhia de metralhadoras e “duas bocas de fogo de artilharia montada”, segundo Rosa Filho (1988). Acrescenta que de Florianópolis seguiu uma coluna constituída pelo 54ª Batalhão de Caçadores e a Força Pública (Polícia Militar) do Estado. O coronel (Guarda Nacional) Manuel Fabrício Vieira, por outro lado, que havia se oferecido para enfrentar os homens de José Maria no Irani e recebera um não precisa, se incorporou à expedição, assim como outros grandes fazendeiros e caudilhos de Santa Catarina e do Paraná (SOUZA, 1987, p. 129).
A primeira providência de Pyrrho, foi enviar oficiais e praças a paisana para buscar informações nas regiões do Irani e Jacutinga, sob o comando do capitão Antônio Ribeiro dos Santos, “guiados por vaqueanos”. Esses homens andaram 10 dias pela área, percorrendo cerca de 400 quilômetros (60 léguas) e constataram que “em certos quarteirões, os sitiantes haviam fugido”, informa Souza. “O facínora José Fabrício, vulgo Juca Fabrício, sumira. Quatro membros da família Germano e o preto Sebastião”, este acusado de ter se apossado da arma de um policial no combate, “não foram encontrados no lugar” (Catanduvas). “Da família Fabrício só se achava em casa Miguel, por estar doente” (SOUZA, 1987, p. 130).
Esses militares relataram que “no Faxinal dos Fabrícios, povoado de 13 casas”, havia uma “decente capela, onde se notava, no altar, entre outros santos, o retrato de João Maria”. O restante de Irani “é todo de sítios isolados, em geral, cômodos, providos do necessário, próximo das roças. Aparentava zona próspera”, cita o autor. No local onde ocorrera o combate e “na casa de Bentinho”, os mesmos militares encontraram 20 gorros, cantis, bandoleiras, quatro capotes da polícia e um chapéu “com fita branca que pertenceu ao monge”, segundo “A república” de 19 de dezembro de 1912 (SOUZA, 1987, p. 130-131).
De acordo com Rosa Filho (1998), tropas da cavalaria do Exército percorreram todas as estradas de acesso a Irani e o “local do encontro anterior foi minuciosamente batido e explorado nos seus arreadores. Nada foi encontrado. Informações dos poucos moradores, ainda apavorados, resultaram no retrocesso da coluna”. Dessa forma, “depois de peregrinar quase um mês pelos arredores palmeirenses, a esperançosa Coluna Pyrrho era dissolvida, sem ter um só encontro com os rebeldes sertanejos”.
Os resultados foram decepcionantes para os dois autores paranaenses, enquanto o Ministério da Guerra se justificava, “dizendo que era impossível o Exército organizar um plano de combate e, vista de ser desconhecida a topografia do terreno”. Isso significava a ausência de mapas precisos, tornando o local “quase inatacável”, já que a “formação acidentada do terreno assegurava aos fanáticos magníficas posições”. A tudo isso se somou a falta de vias de transporte adequadas, tornando a perseguição uma “verdadeira inércia”. Uma vez “desbaratados, mas vencedores no primeiro encontro, os fanáticos sobreviventes retrocederam para a margem esquerda do rio do Peixe”, indo se refugiar na região de Campos Novos (ROSA FILHO, 1998).
Enquanto as buscas aconteciam, foi aberto um inquérito policial em Palmas, visando apurar os detalhes do combate de Irani, visando satisfazer a opinião pública que “exigia a punição dos culpados”. Ao mesmo tempo, um conselho de guerra investigou a participação dos oficiais sobreviventes do combate. “Do lado dos bandoleiros”, destaca Souza (1987, p. 131-132), “apontava-se como o maior responsável, como se observa nos primeiros comunicados, Miguel Fragoso”, um “posseiro na zona do Irani chamada Sertãozinho, no lugar Engenho Velho”, nas margens do rio Uruguai, hoje município de Concórdia. “Teria sido ele o comandante de briga, uma espécie de general fanático, na polvorosa espera do Banhado Grande”.
Nascido em Rio Negro (PR) por volta de 1856, Miguel Soares Fragoso era filho de Honório Soares Fragoso e Maria do Pilar, tendo se casado em 17 de maio de 1874 com Maria Vieira Machado, filha de Manoel Vieira Machado e Anna do Rosário [informações enviadas por um descendente dos Fragoso, Henrique Fendrich]. Estava com cerca de 38 anos de idade quando participou da Revolução Federalista (1893-1895), tendo ingressado nas tropas de Gumercindo Saraiva. Sua presença nas frentes de combate foi registrada pelo médico Ângelo Dourado, que acompanhou as forças federalistas (DOURADO, 1977, p. 220-221; 227).
Outras informações sobre ele são do frei Valentin Tambosi, autor da primeira parte do Livro de Crônicas da Capela de Nossa Senhora Aparecida de Engenho Velho (Paróquia N. S. do Rosário, Concórdia). O texto de frei Tambosi foi reproduzido pelo lavrador e funcionário público José Antônio Puntel e entregue ao autor. Nascido em 10 de julho de 1943, em Engenho Velho, Puntel reúne depoimentos de antigos moradores e escritos sobre a história do lugar.
“Engenho Velho é uma localidade situada na confluência do lajeado dos Fragosos com o rio Jacutinga, uns 25 quilômetros de Concórdia, na estrada Concórdia-Itá”, escreve frei Tambosi na década de 1940, com base em antigos relatos de franciscanos. “É um dos lugares mais antigos de Concórdia e está ligado ao nome e a ação do coronel Miguel Soares Fragoso”, assinala. Fragoso teria chegado à região por volta de 1900, permanecendo “18 meses nos campos do Irani”. Pelas contas do frei, por volta de 1903, Miguel já se encontrava no atual distrito de Santo Antônio da Boa Vista (Concórdia), transferindo-se em 1909 para a barra do lajeado Fragoso (Engenho Velho), um lugar conhecido antigamente como barra de Santa Cruz, no mesmo município (TAMBOSI, 1941).
O fotógrafo Júlio Gomes conheceu as estruturas remanescentes de um engenho hidráulico, mandado construir por Miguel Fragoso. Serrava madeira, fabricava aguardente e açúcar. “Tudo isso está hoje lá embaixo, com cerca de 60 metros de água por cima”, diz, mostrando a paisagem do lago de Itá na altura da foz do rio Jacutinga.
“Por toda a região”, prossegue frei Tambosi, “viviam espalhadas várias famílias, que tinham vindo do Rio Negro com o coronel”, citando os nomes de Augusto, Pedro e Miguel Ruth Schmitt, “e uma irmã casada com Ponciano dos Passos”, além de José e Constante Gren, Joaquim Fragoso (irmão de Miguel) e seu sobrinho José Fragoso. “Em sua maioria moravam perto do atual Engenho Velho, onde cuidavam das plantações e da criação do coronel”, diz frei Tambosi. “Era o sistema feudal dos fazendeiros, sendo Fragoso o cabeça, que de tudo cuidava, indo buscar com cargueiros o necessário em Palmas e Porto União”, acrescenta. Em troca, “trabalhavam todos para o coronel” (TAMBOSI, 1941).
Nilson Thomé traça um perfil interessante desse personagem. “Fragoso era amigo dos principais fazendeiros da região, muitos deles ex-maragatos, como o coronel Domingos Soares, líder político em Palmas”, assinala. Também “mantinha boas relações com a numerosa família Fabrício das Neves, posseira e proprietária de grandes extensões no Irani”. Federalista e monarquista “convicto”, após “se revelar pela coragem em combate, entre 1895 e 1912, mostrou-se pacífico e religioso, vindo a pregar a palavra de Deus”, adotando o uso de “plantas medicinais para curar doentes, com o que passou a ser muito estimado pelos habitantes da região”. Por isso, os caboclos o tinham como um “homem de paz de forte liderança e dispunham-se a defendê-lo ante qualquer ameaça, com o uso de armas, se necessário”. Era chamado de coronel Fragoso como “sinal de respeito”(THOMÉ. 1999, p. 122).
Maurício Vinhas de Queiroz o situa “junto ao rio Jacutinga e sobre a fronteira do Rio Grande”, onde havia um “largo trato ocupado por Miguel Fragoso e seu pessoal desde os tempos que se seguiram ao fracasso do Movimento Federalista”. (1981, p. 92) O “antigo chefe maragato” era “capaz de levantar a qualquer momento 100 homens em armas”, afirma Queiroz, que destaca as ligações entre Fragoso e José Maria (QUEIROZ, 1981. p. 93) .
Em relação a sua participação no combate de 22 de outubro de 1912, no Irani, Queiroz diz o seguinte: “Miguel Fragoso ficara seguramente na reserva, com o grosso de seu pessoal, pronto parta intervir em caso de necessidade para socorrer o monge, embora isto nunca tivesse ficado de todo comprovado nos vários inquéritos policiais e militares que se seguiram aos acontecimentos”. E mais: “O que ficou indubitavelmente apurado é que, se bem não tivesse participado pessoalmente da refrega, grande parte de seu pessoal ali atuou, sem que ele o tivesse podido ou querido impedir”. O autor destaca ainda a “sólida proteção” recebida por Miguel Fragoso do coronel de Palmas Domingos Soares e a “benevolência das autoridades federais” (QUEIROZ, 1981, p. 101).
Voltemos ao frei Tambosi, para que Miguel Fragoso era “homem de muita religião”, e “cuidou que viessem os padres em visita a este lugar”. Além disso, mandou construir uma “capelinha, que seria dedicada a Nossa Senhora da Conceição”. Enquanto a edificação era erguida, Fragoso providenciou a vinda de padres de Palmas, passando por Irani, entre eles os freis Solano Schmitt, Luiz e Dimas, que “celebravam a santa missa na própria casa do coronel”, em Engenho Velho.
Pouco antes da conclusão da capela, entretanto, “deu-se o desastre. Faltando os pregos, empilharam a madeira dentro da igreja. Na queima de uma roça vizinha, queimou também a capela”, em 1910. Desde o ano anterior, devido a problemas de saúde com a esposa, Miguel Fragoso havia construído uma casa próximo do engenho. Sobre ele, frei Solano Schmitt escreveu várias crônicas em edições da revista “Vida Franciscana” (TAMBOSI, 1941). Segundo Nilson Thomé (THOMÉ, 1999, p. 125), o monge José Maria teria conhecido Miguel Fragoso por volta de 1910, com quem teria “aprendido, ao menos em parte, lições de religião e homeopatia”.
Barra do rio Jacutinga (Concórdia-SC), ligada ao lago de Itá-SC.
Território de Miguel Fragoso e José Fabrício das Neves.
Território de Miguel Fragoso e José Fabrício das Neves.
Referencias
SOUZA, Fredericindo Marés de. O presidente Carlos Cavalcanti e a revolta do Contestado. Curitiba: Lítero-Técnica, 1987.
ROSA FILHO, João Alves. Combate de Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998.
DOURADO, Ângelo. Voluntários do martírio: narrativa da revolução de 1893. Porto Alegre: Martins Livreiro, 1977.
TAMBOSI, Valentin. Livro de Crônicas para a Capela de Nossa Senhora Aparecida de Engenho Velho. Paróquia N. S. do Rosário, Concórdia, Diocese de Lages. [1941]. 50f. [manuscrito]. (Fotocópia das primeiras páginas cedida por José Puntel. Concórdia, abril 2007).
THOMÉ, Nilson. Os iluminados: personagens e manifestações místicas e messiânicas no Contestado. Florianópolis: Insular, 1999.
SOUZA, Fredericindo Marés de. O presidente Carlos Cavalcanti e a revolta do Contestado. Curitiba: Lítero-Técnica, 1987.
ROSA FILHO, João Alves. Combate de Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998.
DOURADO, Ângelo. Voluntários do martírio: narrativa da revolução de 1893. Porto Alegre: Martins Livreiro, 1977.
TAMBOSI, Valentin. Livro de Crônicas para a Capela de Nossa Senhora Aparecida de Engenho Velho. Paróquia N. S. do Rosário, Concórdia, Diocese de Lages. [1941]. 50f. [manuscrito]. (Fotocópia das primeiras páginas cedida por José Puntel. Concórdia, abril 2007).
THOMÉ, Nilson. Os iluminados: personagens e manifestações místicas e messiânicas no Contestado. Florianópolis: Insular, 1999.
Celso,de pouco á pouco você vai pondo a limpo a verdadeira história do nosso povo, aqui do Contestado. Acredito que o coronel Domingos Soares Fragoso, tenha sido sim o comandante in chefe da batalha do Irani. Pouco se sabe sobre sua história por falta de pesquisas. No entanto você está reunindo vasto material a seu respeito, perseguindo personagens que fizeram parte desta história.
ResponderExcluirParabéms!!! Continue vasculhando.
Júlio Gomes