sábado, 15 de novembro de 2008

José Fabrício das Neves (11)

Antônio Martins Fabrício das Neves (Irani, 7.9.2007). Foto: Marco Cezar



(3ª parte)


Final da entrevista de Antônio Martins Fabrício das Neves a Eunice Cadore Franzack e Delsi Fries (Grupo Resgate do Museu Histórico de Concórdia-SC) em sua residência na Fazenda Bela Vista (Irani-SC) em 17 de outubro de 1990. Abaixo os principais trechos da entrevista, tal como foi transcrita. As informações entre colchetes são minhas.


E os últimos anos do José Fabrício das Neves foram aonde?

Foram aqui, aqui em Concórdia.


Vividos na Vila Concórdia e na Vila?

É, aqui e lá como eles diziam, lá era o rocio eles diziam naquele tempo e aqui era as fazendas, que essa fazenda de Irani aqui era tudo dos Fabrício.


Por sete anos, quando o exército esteve aqui, eles se beneficiaram de alguma forma da, das famílias, dos Fabrício das Neves?

Não. Até nesse ponto a mulher, o pessoal, os velinhos que ficaram por aqui elogiaram muito os soldados, o comandante do, do piquete que ficou, não era muito, e eu cheguei a conhecer os soldados, mas era em torno de uns trinta, trinta, quarenta, mas nunca houve uma intervenção nenhuma por parte dos soldados, muito respeito, ali eles usaram muita, muita gentileza com o povo do mato não se ouviu falar nada, nada, nada, nada, só naturalmente... vieram trocados, então ficavam um mês, uma turma ia para lá voltava outra, então o povo não tinha muito conhecimento, isso já era um ponto de vista muito bom do, do Governador de Curitiba né, que mandava aqui, que não deixava ter muito conhecimento então logo ele cortava, então ocorreu muito, muito, muito quieto, muito em paz aquilo ali, não ouvi nada de lado nenhum, houve muito respeito dos dois lados.


E a família do Fabrício, houve algum que se destacasse além do José Fabrício?

Se destacasse como a Senhora diz?


Na política, no comércio, na indústria?

Não. Naquele tempo o povo tinha a tradição de, de pecuarista, né, então o destaque deles mais foi sobre campo, campo e cultura, pelo jeito que não, mesmo naquele tempo não existia essa ganância de hoje, é como nós falava, o povo o que queria para, ah! Queria pra, pra tudo, eles, então eles nunca se destacaram, se impor no comércio, naquele tempo não, o Fabrício tinha o comércio dele, mas para luta do povo dele, aquele pessoal que iam a Palmas, mas o comércio que eles traziam de lá era só sal e brim, que naquele tempo lã casemira nem pra casar não casava. Eles então tinham aquilo, eles tinham os depósitos como eles diziam, nunca se dedicaram ao comércio, sempre foi pecuária e cultura.


Por que os Fabrício, especialmente o José Fabrício das Neves, não é citado no combate do contestado?

Isso aí, ele não é citado porque que nem como eu disse já hoje, as pesquisas quando começaram vir, que nem hoje a Senhora está aqui, né, querendo saber certos detalhes como é que foi, então eles, eles tinham medo, porque ele, não tinham conhecimento disso, então vinha uma pessoa perguntar uma coisa ou outra, ele não se manifestava em nada, porque saber o que é que estava na idéia deles, que sabe que estavam querendo o que? Então por isso Fabrício no contestado não aparece, não aparece porque ele não foi indicado por ninguém, por causa do... pra não haver mais nada, ficar por aí e ponto.


Mas o senhor confirma que ele tomou parte ativa na batalha do contestado?

É eles que eu sou secundário, e que conta é o que eles contaram, mas ele o que eles diziam que ele, ele foi, ele era um dos primeiro do monge José Maria.


Hoje ele é morto, o Senhor pode nos dar mais algum detalhe a respeito?

Eu acho que o que eu sabia mais ou menos pra... era essa informação, outra coisa...


A emboscada?

É, não, essa emboscada que ele, que ele, o certo da morte dele mesmo, diziam eles que era uma vingança, uma empreitada. Que o que matou ele empreitou com a viúva do João Gualberto, agora se é verdade ou não é eu não sei, né, segundo o que contavam era isso.


O senhor sabe a localização do sepultamento do José Fabrício das Neves?

Sei, sei, até fui, nós isso daqui nesse inverno, tem lá cemiterinho dele que foi o, o irmão dele como eu lhe falei por parte de mãe, que era Tomás Fabrício das Neves, era um irmão dele mas não legítimo, fez o dia que tirou ele, porque mataram ele, degolaram, tiraram a cabeça dele e desses Cesário que lhe falei que morava em Fragoso, e jogaram no poço, morreram ali, então daí, dali a seis dias o meu pai e o Tomás e mais, se juntaram os Fabrício aí e foram procurar, acharam ele jogado dentro da água, mas depois que a força e retiraram dali, que o meu avô tinha uma equipe de homens com ele né, o dia que matou o Fabrício, então eles deixaram ele retirar, daí foram lá e acharam ele, estava dentro da água, tiraram e fizeram uma cova e botaram os três irmãos juntos e mais um tal de Teobaldo e para o Fabrício fizeram sepultura a parte, os outros estão tudo junto numa cova, e o Fabrício está na sepultura dele a parte, eu todo ano eu vou lá.


Esse irmão de criação ou meio irmão do Fabrício, também residiu em Concórdia?

Residiu, residiu.


O senhor sabe mais ou menos identificar a localização?

De onde ele residia?


É.

Era na mesma localização do Fabrício.


No quartel General?

É não ele tinha casa sempre dele de parte né, mas era o mesmo onde estava localizado essa as casas do Fabrício, tinha a do Tomáz também, quando eles iam lá tinha roça e eles iam cuidar por lá, todos eles moravam no campo, esse Tomáz Fabrício foi fazendeiro até não faz muitos anos o filho dele, então eles faziam, cuidavam a fazenda aqui e lá, então sempre eles iam direto lá onde estava o Fabrício, e lá eles ficavam e lá eles tinham o barracão deles de parte, eles não moravam numa casa só...


O Senhor não poderia nos dizer a localização do túmulo do José Fabrício das Neves?

Olha, quem quiser conhecer é a coisa mais simples, quem sai para... Irani, o que atingir o trevo ali em cima desde até o rio Irani, tem a ponte do rio Irani [BR-153], quem vai daqui a esquerda, rio acima é só não deixar a margem do rio que bate no cemitério dele, está alí a uns trezentos metros, quatrocentos metros.


Isso não é segredo né?

Não, não é, isso está lá pra quem quiser ir, pode ir lá até está muito bonito porque, este ano não fui lá ainda, então esee Tomás Fabrício plantou flores, tem roseiras lá da grossura desse cano, subiu nas árvores, então floresce as árvores em cima.


Deve ser lindo!

Então está lá a sepultura dele é feita de taipa, de pedras, a dele aparece porque eu cuido, vou lá, tiro terra, a dos outros já tem só cruz faz muitos anos, né, então a terra espalha, né.


Apesar do seu pouco estudo, o Senhor está escrevendo algumas poesias, o Senhor poderia nos dizer por que?

Olha, sobre esse assunto eu tenho sido muito entrevistado, porque, e eu e explico porque não como músico e nem como repentista, mas nada tendo a deixar de lembrança dessa tragédia desse meu primo passaram, que essa minha gente passaram, então eu escrevi essas poesias, fiz e até quero mandar escrever um livrinho pra mim deixar; então eu estou continuando agora como hoje então eu estou anotando todo dia que passa comigo, muitas coisas meio importante aí eu estou marcando, dia e data, tudo para deixar como lembrança, assim como eu me lembro dos meus, quero que os outros se lembrem também de mim, e deixo isso aí para quem quiser ver e cultivar eu deixo.


Muito bem! Em poucas palavras o Senhor poderia nos dizer o que conta nessas poesias?

A Senhora quer dizer, dizer a poesia pra Senhora escutar?


Alguma, algum assunto referente à poesia.

Isso eu posso fazer, primeiro um verso pra Senhora ter uma noção.


Pois não.

Que eu escrevi e acho que a Senhora vai ler, que diz o seguinte: Isso é recordação do tempo da minha infância, pesquisei desde criança guardando em minha memória, e hoje no ritmo escrevo, a realidade da história. Esse é o meu primeiro verso que eu fiz.


Muito lindo! Mais alguma lembrança que o Senhor queira deixar registrada na gravação?

Não, hoje eu podia fazer como já nós falava no morto Fabrício. Dessas tragédia que eu falei agora, então vou lhe fazer mais um verso. Que é o final, então eu faço o primeiro e o último. Isso foi numa madrugada, então diz o seguinte: Que terrível madrugada, que terrível despedida, no espaço de uma hora a causa foi decidida e hoje só me resta o nome de quem por nós deu a vida.


Alguma mensagem que o senhor queira deixar?

Só me resta agradecer as Senhoras, seus assessores lá que estão fazendo essa pesquisa, tem muita gente que diz não é isso é aquilo, eu sempre gostei do que eu tenho repartir com os outros, não seja de mal que seja de bem. Se é pra mal então nem eu não faço, não vou repartir com ninguém também.


(Fim)



Antônio Martins Fabrício das Neves (Irani, 7.9.2007). Foto: Marco Cezar



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