O combate na visão dos oficiais do Regimento (1ª parte)
Os oficiais sobreviventes do Combate do Irani – José de Souza Miranda, João Busse e Adolpho (Adolfito) Guimarães Ribeiro – se tornaram alvos de suspeitas e acusações, sendo submetidos a conselhos de investigação e de guerra e inocentados. O conselho de investigação foi solicitada por eles ao Governo do Estado, apresentando como testemunhas o comissário de polícia de Palmas-PR, Domingos Nascimento Sobrinho, Amazonas Pimpão e João Pedrozo de Camargo, além de oficiais e praças do Regimento de Segurança, num total de 18 pessoas.
O parecer do conselho registra que o combate contou com “a gente do monge José Maria, em número superior a 300 homens, sendo que a força do Regimento [...] compunha-se de 59 praças e cinco oficiais; que a gente do monge veio parte a cavalo e parte a pé, contra a pequena força, achando-se os caboclos armados com grandes facões, armas de fogo de diversos sistemas, estabelecendo-se o entrevero”. Os oficiais em questão “só se retiraram do lugar do combate depois de esgotados os recursos porque os caboclos tomaram conta da munição”.
O comandante geral do Regimento, coronel Fabriciano do Rego Barros, mandou então que os três fossem submetidos a conselho de guerra, sendo ouvidas outras nove testemunhas oculares, além dos réus.
Capitão José de Souza Miranda
Relata em escrito do dia 08.04.1913 que a coluna sob seu comando, mesmo “estropiada e em terreno desconhecido, travou combate com a horda de fanáticos do monge José Maria em numero superior a 300, ficando assim a nossa força à razão de um homem para cinco ou mais e onde, nas circunstâncias de momento, após esgotar todos os meios de resistência e a munição, retirei”.
Tenente João Busse
Refere-se à “sanguinolenta refrega” entre uma “pequena fração do Regimento de Segurança” e a “horda de fanáticos chefiada pelo famigerado monge José Maria”. Diz que as 27 testemunhas ouvidas confirmaram que soube cumprir o dever.
Alferes Adolpho Ribeiro Guimarães
Rebele as acusações de “fraqueza”, “covardia” e “desorganização” do Regimento no combate de 22 de outubro no Irani. O encontro com a “horda” de José Maria aconteceu em “campo desconhecido”, onde a força foi surpreendida “no ataque por todos os flancos” e ficando exposta “às perigosas contingências que os acidentes do terreno e o número dos atacantes constataram”.
Os cerca de 60 homens sob o comando do coronel João Gualberto estavam “mal armados e estropiados por marchas forçadas por caminhos ínvios, em terrenos acidentados cobertos de mato espesso que nos impedia de ver o que nos esperava à frente, formando antes um contingente para simples diligencia policial, e nunca uma coluna de guerra aparelhada convenientemente para entrar em combate com forças irregulares”, assinala o oficial. “Não é de admirar em tais circunstancias fossemos por eles desbaratados, sem embargo de bravura, do denodo, da temeridade com que, desde o nosso malogrado e intrépido comandante até o mais humilde dos nossos soldados, nos batemos, copo a corpo e a arma branca, com mais de 300 bandidos, afeitos a todos os crimes, à luta irregular e assalto a traição.”
Fonte: ROSA FILHO, José Alves da. Combate do Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998.
Moraes Sarmento
1)
O combate estava no auge. “O alferes Moraes Sarmento, com a face quase bipartida, combalido como morto sobre um lamaçal de sangue, ali ficara dois dias entre a morte e cruciantes padecimentos de ferido abandonado. Sem energias para se levantar, o alferes Sarmento fora visitado pelos jagunços que ficaram senhores do local, fora despojado do relógio de ouro que agradara a um fanático e só não fora morto ‘para sofrer mais um pouco’, na expressão de alguns jagunços que vieram explorar os destroços. Uma velha matuta que se condoera do triste desígnio do alferes, levou-o para o seu ranchinho [...]”. (BANDEIRA, Euclides. Respingos Históricos. Curitiba: Topografia Favorita, 1939. p. 130).
2)
“O alferes Sarmento, com indômita coragem, atirou-se ao mais aceso da luta, tão entusiasmado que quase nem sentiu os golpes que recebia pelo corpo ensangüentado. Numa arremetida furiosa, um jagunço conseguiu desferir-lhe violenta cutilada no rosto, extirpando-lhe o olho direito. Tão forte foi o golpe que ele deixou cair a arma no chão. Com a vista vazada, combalido como um morto sobre um lamaçal de sangue, o bravo oficial caiu sem sentidos ao solo. Um caboclo chegou perto do corpo inerte e levantou o facão para estraçalha-lo. Num relance, o soldado Romão dos Santos viu o perigo e atirou, acudindo a tempo, salvando sarmento do golpe mortal e subjugando o matuto”. (ROSA FILHO, José Alves da. Combate do Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998).
A versão no Processo do Irani
Depoimento do alferes Joaquim Antônio de Moraes Sarmento (Processo do Irani, fls 68-71). Palmas-PR, 4 de novembro de 1912. O atual patrono da Polícia Militar do Paraná estava com 30 anos de idade na ocasião do combate no Irani, era casado, nascido no Ceará e residente em Curitiba.
Resumo
Estava na frente da linha de atiradores, logo rompida pelas forças do monge, sendo atingido no olho por uma facada e posto fora de combate, desacordado. Depois se recupera, contorna uma “casa situada no local do combate” e avista apenas o capitão Miranda tiroteando e muitas praças por terra “assim como muitos fanáticos do Monge”. Não viu o coronel João Gualberto.
É socorrido pelo capitão Miranda, que amarra “um lenço no ferimento”. E “devido ao estado de abatimento do respondente, e a conselho do capitão Miranda, o respondente internou-se no mato e após caminhar uns 15 minutos, mais ou menos, o respondente encontrou-se com o alferes Libindo, que também se achava ferido”. Eles seguiram pelo mato e ao passar por um pequeno arroio foram cercados “por um grupo de fanáticos em número de seis a oito”.
Os rebeldes perguntaram aos dois “se ofendiam a eles fanáticos, tendo o respondente respondido que não os ofendia”. Os “fanáticos se aproximaram e um deles afirmou: ‘Você está morto, mas não tenha cuidado, se você morrer, nós lhe damos sepultura aqui, levamos seu companheiro e depois voltamos buscar você’”. Os homens seguiram com Libindo e um permaneceu com Moraes Sarmento que, “depois de o haver insultado, pediu que o respondente lhe desse um relógio de ouro que consigo trazia”.
Antes disso, Moraes Sarmento entregara a “José Felisberto, a quantia de cem mil réis” que tinha em seu bolso “para que este o guardasse, em virtude das promessas [...] de transportar o respondente para sua casa, o que não fizeram, tendo o respondente permanecido caído naquele lugar” até as 17 horas, “quando reanimou-se e prosseguiu pelo mato até o anoitecer, tendo encontrado um rancho de monjolo onde o respondente pernoitou”.
[É importante destacar que os cem mil réis foram deixados por José Felisberto com um comissário de polícia para ser devolvido ao dono].
Ao amanhecer do dia 23, se pôs a caminho “e sem saber por onde ia saiu no mesmo lugar em que os bandidos o tinham deixado”. Continuou pelo mato, “perdeu-se mais uma vez, tendo porém a felicidade de tempos depois avistar uma casa, e aproximando-se desta”, morada de Lúcio Roberto, onde foi acolhido e tratado até a chegada de um alferes farmacêutico no dia 29.
No dia 30 seguiu para Palmas, aonde chegou no dia 3.11.1912. No depoimento, disse que Pedro, morador da casa em que foi acolhido, pediu seu relógio e ele não deu, alegando ter custado 250 mil réis. “Pedro, depois de o insultar muito, levantou-se do lugar em que estava sentado, dirigiu-se para o respondente e [...] o relógio que se achava no bolso da túnica, disparando em seguida pelo mato”.
Os oficiais sobreviventes do Combate do Irani – José de Souza Miranda, João Busse e Adolpho (Adolfito) Guimarães Ribeiro – se tornaram alvos de suspeitas e acusações, sendo submetidos a conselhos de investigação e de guerra e inocentados. O conselho de investigação foi solicitada por eles ao Governo do Estado, apresentando como testemunhas o comissário de polícia de Palmas-PR, Domingos Nascimento Sobrinho, Amazonas Pimpão e João Pedrozo de Camargo, além de oficiais e praças do Regimento de Segurança, num total de 18 pessoas.
O parecer do conselho registra que o combate contou com “a gente do monge José Maria, em número superior a 300 homens, sendo que a força do Regimento [...] compunha-se de 59 praças e cinco oficiais; que a gente do monge veio parte a cavalo e parte a pé, contra a pequena força, achando-se os caboclos armados com grandes facões, armas de fogo de diversos sistemas, estabelecendo-se o entrevero”. Os oficiais em questão “só se retiraram do lugar do combate depois de esgotados os recursos porque os caboclos tomaram conta da munição”.
O comandante geral do Regimento, coronel Fabriciano do Rego Barros, mandou então que os três fossem submetidos a conselho de guerra, sendo ouvidas outras nove testemunhas oculares, além dos réus.
Capitão José de Souza Miranda
Relata em escrito do dia 08.04.1913 que a coluna sob seu comando, mesmo “estropiada e em terreno desconhecido, travou combate com a horda de fanáticos do monge José Maria em numero superior a 300, ficando assim a nossa força à razão de um homem para cinco ou mais e onde, nas circunstâncias de momento, após esgotar todos os meios de resistência e a munição, retirei”.
Tenente João Busse
Refere-se à “sanguinolenta refrega” entre uma “pequena fração do Regimento de Segurança” e a “horda de fanáticos chefiada pelo famigerado monge José Maria”. Diz que as 27 testemunhas ouvidas confirmaram que soube cumprir o dever.
Alferes Adolpho Ribeiro Guimarães
Rebele as acusações de “fraqueza”, “covardia” e “desorganização” do Regimento no combate de 22 de outubro no Irani. O encontro com a “horda” de José Maria aconteceu em “campo desconhecido”, onde a força foi surpreendida “no ataque por todos os flancos” e ficando exposta “às perigosas contingências que os acidentes do terreno e o número dos atacantes constataram”.
Os cerca de 60 homens sob o comando do coronel João Gualberto estavam “mal armados e estropiados por marchas forçadas por caminhos ínvios, em terrenos acidentados cobertos de mato espesso que nos impedia de ver o que nos esperava à frente, formando antes um contingente para simples diligencia policial, e nunca uma coluna de guerra aparelhada convenientemente para entrar em combate com forças irregulares”, assinala o oficial. “Não é de admirar em tais circunstancias fossemos por eles desbaratados, sem embargo de bravura, do denodo, da temeridade com que, desde o nosso malogrado e intrépido comandante até o mais humilde dos nossos soldados, nos batemos, copo a corpo e a arma branca, com mais de 300 bandidos, afeitos a todos os crimes, à luta irregular e assalto a traição.”
Fonte: ROSA FILHO, José Alves da. Combate do Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998.
Moraes Sarmento
1)
O combate estava no auge. “O alferes Moraes Sarmento, com a face quase bipartida, combalido como morto sobre um lamaçal de sangue, ali ficara dois dias entre a morte e cruciantes padecimentos de ferido abandonado. Sem energias para se levantar, o alferes Sarmento fora visitado pelos jagunços que ficaram senhores do local, fora despojado do relógio de ouro que agradara a um fanático e só não fora morto ‘para sofrer mais um pouco’, na expressão de alguns jagunços que vieram explorar os destroços. Uma velha matuta que se condoera do triste desígnio do alferes, levou-o para o seu ranchinho [...]”. (BANDEIRA, Euclides. Respingos Históricos. Curitiba: Topografia Favorita, 1939. p. 130).
2)
“O alferes Sarmento, com indômita coragem, atirou-se ao mais aceso da luta, tão entusiasmado que quase nem sentiu os golpes que recebia pelo corpo ensangüentado. Numa arremetida furiosa, um jagunço conseguiu desferir-lhe violenta cutilada no rosto, extirpando-lhe o olho direito. Tão forte foi o golpe que ele deixou cair a arma no chão. Com a vista vazada, combalido como um morto sobre um lamaçal de sangue, o bravo oficial caiu sem sentidos ao solo. Um caboclo chegou perto do corpo inerte e levantou o facão para estraçalha-lo. Num relance, o soldado Romão dos Santos viu o perigo e atirou, acudindo a tempo, salvando sarmento do golpe mortal e subjugando o matuto”. (ROSA FILHO, José Alves da. Combate do Irani. Curitiba: Associação da Vila Militar, 1998).
A versão no Processo do Irani
Depoimento do alferes Joaquim Antônio de Moraes Sarmento (Processo do Irani, fls 68-71). Palmas-PR, 4 de novembro de 1912. O atual patrono da Polícia Militar do Paraná estava com 30 anos de idade na ocasião do combate no Irani, era casado, nascido no Ceará e residente em Curitiba.
Resumo
Estava na frente da linha de atiradores, logo rompida pelas forças do monge, sendo atingido no olho por uma facada e posto fora de combate, desacordado. Depois se recupera, contorna uma “casa situada no local do combate” e avista apenas o capitão Miranda tiroteando e muitas praças por terra “assim como muitos fanáticos do Monge”. Não viu o coronel João Gualberto.
É socorrido pelo capitão Miranda, que amarra “um lenço no ferimento”. E “devido ao estado de abatimento do respondente, e a conselho do capitão Miranda, o respondente internou-se no mato e após caminhar uns 15 minutos, mais ou menos, o respondente encontrou-se com o alferes Libindo, que também se achava ferido”. Eles seguiram pelo mato e ao passar por um pequeno arroio foram cercados “por um grupo de fanáticos em número de seis a oito”.
Os rebeldes perguntaram aos dois “se ofendiam a eles fanáticos, tendo o respondente respondido que não os ofendia”. Os “fanáticos se aproximaram e um deles afirmou: ‘Você está morto, mas não tenha cuidado, se você morrer, nós lhe damos sepultura aqui, levamos seu companheiro e depois voltamos buscar você’”. Os homens seguiram com Libindo e um permaneceu com Moraes Sarmento que, “depois de o haver insultado, pediu que o respondente lhe desse um relógio de ouro que consigo trazia”.
Antes disso, Moraes Sarmento entregara a “José Felisberto, a quantia de cem mil réis” que tinha em seu bolso “para que este o guardasse, em virtude das promessas [...] de transportar o respondente para sua casa, o que não fizeram, tendo o respondente permanecido caído naquele lugar” até as 17 horas, “quando reanimou-se e prosseguiu pelo mato até o anoitecer, tendo encontrado um rancho de monjolo onde o respondente pernoitou”.
[É importante destacar que os cem mil réis foram deixados por José Felisberto com um comissário de polícia para ser devolvido ao dono].
Ao amanhecer do dia 23, se pôs a caminho “e sem saber por onde ia saiu no mesmo lugar em que os bandidos o tinham deixado”. Continuou pelo mato, “perdeu-se mais uma vez, tendo porém a felicidade de tempos depois avistar uma casa, e aproximando-se desta”, morada de Lúcio Roberto, onde foi acolhido e tratado até a chegada de um alferes farmacêutico no dia 29.
No dia 30 seguiu para Palmas, aonde chegou no dia 3.11.1912. No depoimento, disse que Pedro, morador da casa em que foi acolhido, pediu seu relógio e ele não deu, alegando ter custado 250 mil réis. “Pedro, depois de o insultar muito, levantou-se do lugar em que estava sentado, dirigiu-se para o respondente e [...] o relógio que se achava no bolso da túnica, disparando em seguida pelo mato”.
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